MINISTÉRIO DA DEFESA E DIREÇÃO POLÍTICA

Eliézer Rizzo*
Alexandre Fuccille**
Paulo Loyola Kuhlmann***
Abril 2007


Esta avaliação da Defesa Nacional brasileira foi coordenada por Eliézer Rizzo de Oliveira. Fuccille aborda avanços institucionais e políticos operados pelo Ministério da Defesa, ao lado de aspectos ainda carentes, destacando também algum progresso na Política de Defesa Nacional, ao passo que Kuhlmann analisa o Serviço Militar em suas conexões societárias e com a Defesa Nacional, além da participação brasileira em Forças de Paz.

Ministério da Defesa e Política de Defesa Nacional

O Ministério da Defesa é condição necessária - ainda que insuficiente - ao exercício do controle civil democrático sobre os militares. No Brasil, a simple existência do Ministério da Defesa não resolve o problema da subordinação militar.

De fato, algumas premissas básicas sobre a direção da Defesa Nacional pelo poder político não têm sido eficientes: a definição dos interesses nacionais, sobre os quais se funda a Política Externa e a Política de Defesa; o tipo e o tamanho das Forças Armadas; as doutrinas militares; as condições de participação militar no campo interno; o controle das atividades-fim e das atividades-meio (educação, orçamento, administração etc) das Forças Armadas; a abertura da agenda sobre defesa nacional à cidadania. Acrescente-se que a sociedade política e civil não têm respondido satisfatoriamente a tais desafios. O Ministério da Defesa poderia trazer melhorias para o sistema, agregando ganhos para a governança e para a governabilidade. Contudo, falta muito ainda para o Ministério da Defesa robustecer-se a ponto de exercer a direção e gestão plenas em cada uma das Forças. Os principais postos do Ministério da Defesa são ocupadas por militares, decorrendo daí o controle exclusivo de controle de pessoal civil e militar, funções e missões, dentre outras competências-chave.

Apesar disto, o Ministério da Defesa tem conseguido otimizar o sistema de Defesa Nacional na direção de maior integração e racionalização das atividades comuns e do emprego combinado dos meios navais, aéreos e terrestres, aumentando a capacidade de dissuasão do Aparelho Militar. Marcha-se a passos largos para uma próspera integração em política, treinamento e doutrina entre as Forças Singulares, apesar do anêmico Estado-Maior de Defesa. A nova Política de Defesa Nacional (PDN), implementada a partir de 2005, representa um importante avanço no trato das questões de defesa no Brasil, somando-se a ela a Estratégia de Defesa Nacional (EDN), documento de alto nível anteriormente separado e de caráter reservado.

Após a aprovação da nova Política de Defesa Nacional, seguiu-se a revisão de outros documentos doutrinários de alto nível, como a Política Militar de Defesa (PMD), a Estratégia Militar de Defesa (EMiD). Paralelamente, as Escolas Militares em seus três níveis de formação (graduação, aperfeiçoamento de oficiais e Estado- Maior) tornaram obrigatório em seus currículos o ensino da PDN, o que não era feito ainda em pleno século XXI.

Em suma, o Brasil, com mais de 15.000 quilômetros de fronteiras secas, cerca de 8.000 quilômetros de litoral e um imenso espaço aéreo, além de fazer divisa com mais dez nações, não pode prescindir de Forças Armadas na tarefa de proteção e defesa de seu território. O estabelecimento de uma agenda pública, transparente e factível no tocante à defesa nacional, com o envolvimento amplo da sociedade civil e política, representará um importante passo rumo à superação da precária institucionalização do controle civil democrático hoje vigente em relação às Forças Armadas e ao fortalecimento e aprofundamento da jovem democracia brasileira, com o Ministério da Defesa exercendo as tarefas que lhe cabem em sua plenitude.

Serviço Militar e missões de Paz

O serviço militar, além de ter a missão de arregimentar pessoas para completar os quadros das forças rmadas, não pode ser dissociado da visão de construção da nação, dentro de uma perspectiva de integração nacional e de estratégia da presença, preocupações extremamente caras, principalmente ao Exército, e que se vêem corroboradas pelas políticas de governo recentes.

A integração de populações, nas regiões de fronteira mais longínquas, aos quadros do Exército diminui o vazio geográfico e instaura a ocupação dessas regiões,ao menos por parte das Forças Armadas, notadamente na região amazônica. No Exército, esta incorporação se traduziu em 2006 no efetivo de recrutas (96 mil) maior do que o de soldados profissionais (81 mil), segundo dados do Ministério da Defesa.

Apesar desse alto percentual de efetivo de recrutas, não há contestação degrande monta por parte da sociedade civil, nem grandes articulações no Congresso Nacional para que ocorra o fim do serviço militar obrigatório. Um dos motivos é o pequeno percentual de recrutas incorporados em relação aos alistados (jovens na faixa etária em condições de servir). No período de 1987 a 2006, esse percentual variou de 9,44% (ano de 1988) a 5,05% (ano de 2005).

Durante os anos de 1997 até 2003, o efetivo de recrutas permaneceu por volta de 70 a 80 mil, o que pareceu ser uma tendência de profissionalização do Exército; entretanto, a partir de 2004, o governo federal lança o Programa Soldado Cidadão, incluído no Programa Nacional de Estímulo ao Primeiro Emprego1; o efetivo aumenta para 107 mil, em 2004, e a demanda dos quartéis que receberam soldados desse programa foi a de formá-los militarmente, mas, principalmente, conferindo a eles formação por meio de institutos civis de diversas áreas (Comércio, Indústria, Turismo, dentre outras).

Portanto, ainda consoante à idéia de assumir missões subsidiárias que proporcionem a "Segurança e Desenvolvimento" nacional - a construção de estradas e a contenção de doenças (dengue e febre aftosa) - o serviço militar tem sido revestido dessa função civilizatória.

Com relação às missões de paz desencadeadas pelo Brasil e seus centros de treinamento, somente o Exército possui um centro com a finalidade de preparar militares e civis, denominado Centro de Instrução de Operações de Paz (CI Op Paz) 2, criado em 23 de fevereiro de 20053, e que se situa no Rio de Janeiro.
Anteriormente o Brasil havia enviado grandes efetivos militares a missões de paz, notadamente na década de 1990, principalmente a Angola e Moçambique. Nesses casos, o encargo de treinamento e adestramento ficou por conta da 5ª Subchefia do Estado-Maior do Exército.

O início das atividades do CI Op Paz ocorreu com o preparo da Brigada Haiti, para cumprir a Missão das Nações Unidas para a Estabilização do Haiti (MINUSTAH). Um dos intuitos do Centro era preparar tropas para emprego de acordo com o Capítulo VII da Carta das Nações Unidas, ou seja, operações de manutenção de paz. Entretanto, como se pode depreender do dístico do Centro - Se queres a paz, prepara-te para sua imposição - e da própria sequência dos acontecimentos no Haiti, onde as forças de paz têm atuado como forças de imposição de paz.

Na Marinha, o treinamento é realizado basicamente nas unidades de fuzileiros navais, já que atuam como tropa nas operações de paz. A fase final do adestramento é realizada por meio de exercícios anuais da Força de Emprego Rápido, em Itaóca (ES), visando à prática de procedimentos pertinentes a uma Força de Paz da ONU.

A Força Aérea participa com número reduzido nas Forças de Paz, já que seus militares somente atuam em funções de Observadores Militares ou de Estado Maior, não compondo tropas. Realizam seu treinamento em Centros de Operações de Paz de outros países ou mesmo no Exército. Somente o Exército possui um centro com a finalidade de preparar militares e civis.


* Coordinado por Eliézer Rizzo de Oliveira Diretor do Centro Brasileiro de Estudos da América Latina (Memorial da América Latina).
** Pesquisador do Núcleo de Estudos Estratégicos, Universidade Estadual de Campinas
*** Tenente-coronel da reserva do Exército Brasileiro

(1) Ministério do Trabalho e Emprego, Soldado Cidadão - Programa Nacional de Estímulo ao Primeiro Emprego - PNPE - http://www.mte.gov.br/pnpe/soldado.asp
(2) Página na internet do Centro de Instrução de Operações de Paz - http://www.cioppaz.ensino.eb.br/
(3) Comandante do Exército, Portaria nº 090, de 23 de fevereiro de 2005. Cria o Centro de Instrução de Operações de Paz. Boletim do Exército n° 08, Brasília: Secretaria-Geral do Exército, 25 de fevereiro de 2005, p.35.http://www.sgex.eb.mil.br/be_ostensivo/BE2005/be2005pdf/be08-05.pdf